Os salários em Portugal: padrões de evolução, inflação e desigualdades

Entre 2018 e 2021, registou-se um crescimento rápido do valor real da média e da mediana dos salários em Portugal, aferido neste estudo pela evolução dos ganhos brutos mensais médio e mediano e das remunerações brutas médias mensais por trabalhador. Este crescimento foi desigual ao longo do tecido económico, tendo sido bastante mais pronunciado nos setores de atividade económica que, em geral, praticam salários médios mais baixos. Tal sugere a preponderância dos aumentos sucessivos do salário mínimo nacional (SMN) na explicação desta tendência.

Todavia, o crescimento do valor real dos salários médio e mediano ocorreu de forma muito tardia, se considerarmos que a recuperação da crise económico-financeira do início da década de 2010 verificou-se partir de 2014. Na realidade, o aumento do valor real dos salários médio e mediano entre 2014 e 2021 deu-se quase sempre a um ritmo bastante inferior ao da evolução do PIB. E mesmo a valorização real ocorrida desde 2018 está já a sofrer uma forte erosão, causada pelo surto inflacionário iniciado em 2021.

Uma análise mais detalhada a um indicador de salário – o ganho médio mensal bruto – revela outros matizes desta tendência. Em primeiro lugar, a ocorrência de um processo de achatamento da metade inferior da distribuição do ganho, acompanhado por uma redução da desigualdade entre as partes superior e inferior dessa distribuição. Para este processo estarão a contribuir o aumento do SMN, mas também a redução do prémio das habilitações escolares. No caso do SMN, constatou-se que este tem efeitos diretos no aumento dos salários médios na base da distribuição (bite effect), mas também efeitos indiretos em latitudes intermédias (spillover effect).

Em segundo lugar, a convivência entre uma tendência global de redução da desigualdade de ganho entre mulheres e homens com a persistência da desigualdade em prejuízo das mulheres quando se comparam trabalhadores com perfis semelhantes. A este nível, analisou-se também a interseccionalidade das desigualdades de género e de nacionalidade. Em terceiro lugar,  identificou-se a tendência de precarização dos vínculos laborais dos trabalhadores por conta de outrem ao longo da última década e observou-se a persistência da forte penalização salarial dos trabalhadores com contratos não permanentes – em particular, a partir dos 45 anos. Por último, mediu-se a valorização diferenciada da formação escolar nos vários setores de atividade.

Palavras-chave: salários e ganho; salário mínimo nacional; inflação; desigualdades; prémio das habilitações escolares; precariedade; género; nacionalidade.

Autores: Frederico Cantante e Pedro Estêvão.

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